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sábado, 1 de maio de 2010

Cordel da Contra Cultura



A cultura nacional
Anda muito devagar
Não sabe se vai festeira
Ou se fica no jabá
E a música popular brasileira
Só a história vai lembrar

Nossos críticos de arte
Deveriam ter manual
São tantos teoricismos
Que ninguém sabe explicar
Me perdoem o pessimismo
Mas o artista só quer criar

O teatro é visto apenas
Por pequena parte da população
É que ele perdeu audiência
Para os canais de televisão
O ator quer sua evidência
E o público quer outra diversão

O trabalhador da arte
É chamado vagabundo
E pouca gente sabe
Como ele cria o mundo
Sem nenhum salário base
E nem um pequeno fundo

O rádio há muito tempo
Era aquela curtição
Agora ele se tornou
Peça de decoração
Perdeu sua eficiência
Para o Domingão do Faustão

O circo foi fechado
E o menino ficou na rua
O sinal está vermelho
E começa sua agrura
Vira malabarista arteiro
Cospe fogo, engole desventura

O cinema brasileiro
Ganhou muita reputação
Colocou na grande tela
Muitas cenas de ação
Eu já digo sem cautela
Que isso é americanização

A pintura saiu da parede
E ganhou tri dimensão
Já não cabe numa sala
Pois virou instalação
Chamam arte contemporânea
Eu, liberdade de expressão

A cultura brasileira
É um grande bordão
Todo povo é artista
Nos pampas e no sertão
É um povo que samba
É um povo artesão
 
Para quem me entendeu
Eu fico muito feliz
Mas vou deixar ao leitor
A sua própria opinião
Quem junto vier compor
Da arte será cidadão

Kátia Quirino

EQUILÍBRIO DELICADO


Esta é uma reflexão filosófica.
Quem nunca sentiu uma angústia irremediável, aquele desconforto, um desespero de sei lá o quê?
Já passei por três tipos de desespero na vida. Sou deveras existencialista, e, como tal, preciso sofrer bastante para entender certas coisas. Vamos aos fatos.
Primeiro desespero: sentir-me sem eu mesma. Sabe aquela sensação de perder-se de si próprio? Isso aconteceu em certo momento do meu segundo casamento, principalmente quando meu ex marido me disse a seguinte frase no meio de uma discussão:
_ Nós dois somos um só, não existe eu e você.
Qualquer mulher poderia achar muito romântico, eu achei aquilo estranho. Então eu não sou eu, sou o meu somatório com outro que não eu mesma? Então ele também não é ele? Eu não gosto de carne mal passada e muito menos tenho pau...
Não consigo ver o amor dessa forma, exceto no momento do orgasmo. Momento este sublime, esplêndido e valioso. Individualidade vale para tudo, inclusive para o casamento. Egoísmo? Só quero meu eu de volta.
O segundo desespero é quando meu eu não quer mais ser ele próprio. Um dia desses, saí de casa para o trabalho e bati o carro recém comprado em suaves sessentas prestações na coluna do estacionamento. Amassou, arranhou e me deu um baita prejuízo. Chegando ao trabalho, bronca do chefe, pagamento atrasado e sem internet o dia inteiro. Volto para casa e pasme, cortaram minha luz. Ligo para a amiga e o celular está fora de área. Saio para comprar velas e encontro o chato do síndico que reclamou do barulho no meu apartamento. Chega!
Só faltou tocar o telefone e ser meu ex marido no outro lado da linha pedindo dinheiro emprestado. Isso aconteceu no outro dia de manhã, mas não vem ao caso.
O terceiro desespero é quando meu eu quer ser ele próprio de qualquer maneira e, em determinados momentos, não consegue ser. Sabe aquela sensação de perder o espírito quando um conhecido daquele tipo malandro de botequim te implora um voto para vereador e você diz que vai votar só para encerrar a conversa que já dura uma hora. De verdade, eu queria dizer que nunca votaria nele porque ele é um idiota que não sabe a diferença entre um político e um bêbado chato.
Depois de tanto desespero, resolvi me aproximar de Deus. Afinal, o desespero é viver a morte diariamente. E a fé em algo superior nos conforta a alma e nos faz crer que tudo tem um propósito maior.
Vivemos desesperados e nem nos damos conta disso. O eu sempre quer aquilo que não tem e quer ser aquilo que não é. Diariamente. O desespero é um sofrimento do espírito. Morrer sem cessar, morrer sem morrer e morrer a morte. Desse desespero que ninguém escapa, mesmo que não o saiba conscientemente. Isso fica incomodando, pois da morte todo mundo tem medo.
Preciso mesmo me aproximar de Deus e saber o que ele pretende para mim. Um terceiro marido? Outro emprego? Um bom psicólogo?
Se pudesse pedir, pediria um pouco menos de mim, um pouco mais de mim e... claro, muita fé. Fé para aguentar o rojão sem cair no desespero e para alcançar o equilíbrio entre os meus tantos eus.


Kátia Quirino
Crônicas Poéticas e Hipotéticas

Noel Rosa

Último Desejo
(Noel Rosa)

Nosso amor que eu não esqueço
E que teve seu começo
Numa festa de São João
Morre hoje sem foguete
Sem retrato e sem bilhete
Sem luar sem violão
Perto de você me calo
Tudo penso nada falo
Tenho medo de chorar
Nunca mais quero seu beijo
Mas meu ultimo desejo
Você não pode negar
Se alguma pessoa amiga
Pedir que você Ihe diga
Se você me quer ou não
Diga, que você me adora
Que você lamenta e chora
A nossa separaçao
E as pessoas que eu detesto
Diga sempre que eu não presto
Que o meu lar é o botequim
Que eu arruinei sua vida
Que eu não mereço a comida
Que você pagou prá mim